domingo, 17 de fevereiro de 2013

Livros por toda parte. Nova Friburgo.

Livros por toda a parte

Município brasileiro estimula o gosto pela leitura com ações criativas, que desenvolvem a imaginação

"Esse livro é de quem achou, leia e passe adiante". Estratégia da prefeitura de Nova Friburgo para incentivar a leitura em toda a cidade.
"Esse livro é de quem achou, leia e passe adiante". Estratégia da prefeitura de Nova Friburgo para incentivar a leitura em toda a cidade.
Livros espalhados pela cidade fazem parte do conjunto de ações que vêm sendo desenvolvidas em Nova Friburgo (RJ), município que conta com a primeira Secretaria de Leitura do Brasil. O profissional de Artes Cênicas e conhecedor das técnicas de contação de histórias, Francisco Gregório da Silva Filho, assumirá a secretaria até o final do mês de março.  Ele é servidor público federal do quadro da Fundação Biblioteca Nacional, vinculada ao Ministério da Cultura. Foi coordenador do Programa Nacional de Incentivo à Leitura (Proler) na década de 1990 e atuou como presidente da Fundação Cultural Elias Mansur, no estado do Acre.
Eliana Yunes
Todas as ações para incentivar a prática da leitura em Nova Friburgo estão sendo incrementadas com a criação, inédita, da secretaria municipal específica. Ela foi institucionalizada em dezembro do ano passado, dentro do projeto de reforma administrativa do governo municipal. Mas logo no início de 2009 um trabalho de estímulo à leitura começou a ser realizado pelo escritor e educador carioca Álvaro Ottoni de Menezes. As atividades fizeram aumentar em 120% a frequência à Biblioteca Municipal (mais de 300 pessoas por dia), capacitar cerca de 500 professores e atender 22 escolas da cidade.
Para a professora, pesquisadora e uma das coordenadoras da Cátedra Unesco de Leitura PUC-Rio, Eliana Yunes, “a secretaria agora criada terá status para dialogar com outras secretarias e propor ações no campo da saúde, do meio ambiente, dos transportes, da política habitacional etc”. 
Yunes defende que é preciso “ler” nos hospitais, presídios, escolas, paradas de ônibus, salas do Detran etc. “A leitura, sobretudo a literária, pode dar a conhecer uma pessoa a si mesma. E isto faz a diferença na hora de agir”, destaca.
Ela frisa que não há em todo o Brasil uma secretaria similar, embora existam ações importantes de secretarias de educação e de cultura. Para ela, Nova Friburgo tem uma vocação cultural e “esta gestão nova, com um prefeito de 84 anos à frente, soube reconhecer isso”.
Biblioteca móvel
Um ônibus-biblioteca, com acervo de mil títulos, foi, no ano passado, um dos instrumentos de trabalho de  Álvaro Ottoni, ex-diretor da Biblioteca Municipal de Nova Friburgo, e convidado pelo prefeito Heródoto Bento de Mello para assumir, em 2010, o cargo de assessor especial do gabinete. Ele e uma equipe de artistas, educadores e outros profissionais deram início a esse e outros trabalhos pró-leitura.  Com a biblioteca-móvel, o objetivo é atingir as 136 escolas municipais e mais de 50 particulares espalhadas pelo município. O serviço inclui a capacitação de professores, que é uma das práticas que ajudam na formação de leitores.
Pesquisa recente do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope) revela que uma em cada quatro pessoas entrevistadas acredita que um professor bem capacitado é o fator mais importante para assegurar a boa educação das crianças e jovens do país. A pesquisa foi feita por telefone com 1.350 pessoas de nove regiões metropolitanas brasileiras e de alguns municípios com mais de 50 mil habitantes. O resultado foi divulgado no dia 11 de novembro pelo Movimento Todos pela Educação.
Em Nova Friburgo, o trabalho pró-leitura com os professores e estudantes inclui atividades artísticas, contação de histórias, dramatização, oficinas, música e outras práticas interativas. Além do acervo de livros, o ônibus-biblioteca tem dois computadores, 23 cadeiras, DVD, caixa de som, microfone, videocassete e outros equipamentos.
Segundo Ottoni, “o ônibus fica uma semana na mesma escola ou até um mês, se for o caso”. Depende, também, do tamanho do colégio.  O passo inicial é dado com a qualificação, com foco na leitura, dos professores de todas as disciplinas da escola e depois vêm as atividades com os alunos.
Alvaro Ottoni
A biblioteca-móvel é apresentada aos professores num dia de conselho de classe. Logo em seguida começa a capacitação, que desperta o lado criativo do professor. Para isso, as técnicas do teatro, a música e a contação de histórias são muito utilizadas. “Mostramos como fazer da sala de aula um ambiente propício à criação, ao diálogo, ou seja, uma sala de aula viva. Nesse trabalho, o debate é estimulado e a criatividade, com ênfase na leitura, é despertada. “É um momento encantador, e os professores se transformam mesmo”, diz Ottoni.
Áudio de Álvaro Ottoni

O interesse dos 326 alunos da Escola Municipal Francisco Silveira  pelo livro e leitura aumentou bastante, após o trabalho de fomento à leitura organizado e levado até as escolas da cidade. Essa é a opinião da diretora Rosângela Oliveira Neves, no cargo há mais de 10 anos. “Em nossa escola, ficamos impactados. Toda a equipe escolar participou do trabalho, que é muito voltado para o lúdico, com dinâmicas de grupo, desenvolvimento da interdisciplinaridade e outras ações”, diz a diretora. Segundo ela, o rendimento dos alunos vem melhorando em todas as áreas.
“O livro é um aprendizado. A gente lê uma vez e aprende o que está escrito. Depois, vai melhorando cada vez mais,” afirma Luiza Salviano de Lima, 12 anos, aluna do 5º ano da Escola Municipalizada José Eugênio Muller, localizada na área rural de Nova Friburgo. Ela atribui o seu encantamento com a leitura à visita da biblioteca móvel à sua escola, à atuação da professora e também o envolvimento da mãe. “Antigamente eu não lia muito”, diz a estudante, que hoje aprecia livros de poesia e de contos de terror.

Ouça o depoimento de Luiza

Andreza
A menina Andreza Aparecida Ventura Santos, 11 anos, da 4ª série da Escola Municipal Francisco Silveira, relata que depois que ela começou a ler mais, sua nota em Português mudou. “Eu errava muito ortografia.” afirma a estudante. “Falo muito sobre livros com a minha mãe. A biblioteca- móvel incentiva muita gente a ler”, destaca. 
Para as professora Zuleika Lessa e Patrícia Neves, que trabalham na área rural de Nova Friburgo, as crianças de suas escolas tiveram grande motivação para o trabalho que une leitura e atividades artísticas. “Talvez a dificuldade que possuem de acesso aos livros e também aos equipamentos eletrônicos seja também uma das causas desse grande interesse que todas demonstraram na ocasião”, assinalam.
Projetos modificadores
As ‘Janelas de Leitura’, construções em forma de chalés de 80 m² que existirão em todos os bairros e distritos de Nova Friburgo, fazem parte do projeto de ações iniciais da Secretaria de Leitura.
Outra ação de destaque é a dos multiplicadores, que espalham livros pela cidade, numa proposta de “esse livro é de quem achou; leia e passe adiante”.
O aumento da frequência à Biblioteca Municipal deve-se muito  às várias atividades que vêm sendo colocadas em prática, como  o Clube do Livro, que oferece debates sobre a obra; o projeto ‘Dois Dedos de Prosa’, que promove encontro com escritores; a contação de histórias, dentre outras.  “A biblioteca está cada vez mais viva”, expressa Álvaro Ottoni.
Leitura da Vida
Fabiano dos Santos
Fabiano dos Santos
Fabiano dos Santos Piúba, diretor do Livro, Leitura e Literatura (DLLL) do MinC, não tem nenhuma referência de um município ou de um estado brasileiro que tenha criado uma secretaria específica para a área de leitura. “Essa é uma experiência instigante e ao mesmo tempo uma experiência institucional de uma política pública municipal”.
Para o diretor do MinC, que no período de 2005 a 2007 coordenou as Políticas do Livro e de Acervos da Secretaria de Cultura do estado do Ceará, onde concebeu e coordenou o projeto Agentes de Leitura, os grandes problemas dos cidadãos acontecem nas localidades, de modo que as políticas têm que estar voltadas para esses locais. “Uma política cultural pode mudar não apenas as faces das pessoas, mas também as faces das cidades”, ressalta.

O prefeito de Nova Friburgo concorda: “A leitura não é só de livros, é muito maior. É preciso formar as pessoas a saberem ler. Ler tudo o que está em volta delas: ler o livro, ler a situação, ler a paisagem, ler a vida, ler a conjuntura. Saber ler é saber sentir o que se passa em torno da gente”, enfatiza.

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“Esperamos que essa secretaria, no desenvolvimento do Plano Municipal de Nova Friburgo e também dos programas e ações, possa servir de parâmetro, de referência para que outros municípios também tomem iniciativas como essa”, destaca Fabiano.
Fórum Mais Livro e Mais Leitura
Os planos municipais foram tema de debate no Fórum Mais Livro e Mais Leitura nos Estados e Municípios, realizado em outubro do ano passado, em Brasília.  O objetivo do evento, que contou com a participação de mais de 200 secretários municipais e estaduais de cultura e educação, foi justamente estimular a criação e a implantação de planos de livro e leitura nas cidades brasileiras. Este é um dos objetivos do Plano Nacional de Livro e Leitura (PNLL), instituído no Brasil em 2006, por meio de Portaria conjunta dos Ministérios da Cultura (MinC) e da Educação (MEC).
“Embora os indicadores de leitura no Brasil ainda sejam muito baixos, a cada ano esses quadros vêm sendo melhorados por meio de iniciativas do Estado e da sociedade civil”, revela Fabiano dos Santos. Ele disse que, ao final do fórum, 68 municípios (15 estados) aderiram ao projeto de estímulo à criação e implantação dos planos de livro e leitura, lançado durante o evento.

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Segundo Ottoni, já existe um pré-projeto do plano municipal de leitura, elaborado em conjunto com a Cátedra Unesco de Leitura, sob coordenação de Eliana Yunes. Para a coordenadora da Unesco, “o plano, nascido de baixo para cima, vai ser tocado, com melhor reforço, pela Secretaria Municipal de Leitura, que se faz despojada, sem vícios administrativos”. Uma secretaria que, em sua opinião, vai precisar de apoio e orientação, num trabalho articulado ao plano estadual e federal existentes.
Para o diretor da DLLL/MinC, a formulação de planos estaduais e municipais é importante porque estabelece diretrizes para a política relacionada à democratização do acesso ao livro, à formação leitora, à valorização da leitura na comunicação e ao desenvolvimento da economia do livro.
(Texto: Gláucia Ribeiro Lira, com colaboração especial de Marcelo Lucena)
(Vídeo do prefeito: Groove Comunicação – Vídeo secretário/MinC: Rodrigo Coimbra)
(Foto do ônibus biblioteca-móvel: Maurício Porão)

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