terça-feira, 11 de junho de 2013

" Z.P.O." Uma vida de coragem e luta.



Homenagem a Z.P.O.


"Pequena e Grande mulher."

Um relato da trajetória da vida desta grande mulher.

Nascida em cidade interiorana.
Filha caçula de quatro irmãos, três mulheres e um homem. Perdeu o pai aos dois anos, e aos nove anos perdeu a mãe.
Filha mais nova, passou a viver com uma das irmãs mais velhas,  desde tenra idade, aprendeu os ofícios do cuidados da casa,  o esmero a preparar as refeições, foi poupada, e forçada logo cedo a aprender qual gente grande, que a vida não é fácil.
Trabalhou na roça, ajudando no orçamento, trabalhou na lavoura, aprendeu a se comportar.
De índole meiga, determinada,corajosa, aprendeu desde cedo a ser forte.
Não foi a escola, era muito longe, o caminho perigoso, as tarefas da casa eram ainda as mais importantes, laborar era preciso, se todos plantassem,  tinham o que comer, se todos trabalhassem, teriam alimentos e poderiam vender uma parte que seria separado para troca  por alguns produtos que não eram fabricados por eles mesmos.
Muito jovem, conheceu um rapaz, tocador de violão, pandeiro e animador de bailes, trabalhador honesto, morador das imediações do sítio onde morava.
Quando se morava nos sítios  longínquos das cidades, o costume era apresentar o rapaz a família, se esta aprovasse, pedia-se a bênção dos tutores, dos pais, ou dos parentes mais próximos,  quando aparecesse algum funcionário dos cartórios pelas redondezas,  oficializava-se o casamento. O trajeto era muito longo, não se dispunha de  transporte eficiente, o mais comum  era ao lombo dos cavalos,  charretes somente em casos  especiais.
A irmã concedeu a moça e então foi morar com esse jovem.
Vida difícil, vida de calos nas mãos, tirar água de poços, buscar lenha no mato para alimentar o fogão,
lavar a roupa no riacho, plantar e preparar as refeições.
Logo vieram os filhos:
A primeira filha, menina bonita, risonha, carinhosa, faceira.
O segundo Deus levou com sete dias.
O terceiro, menino corado, bonito, forte, corajoso,
A quarta  menina sadia, irrequieta,
O quinto, menino formoso, rechonchudo, meigo.
A sexta, menina pequenina, loura, viva, ligeira.
O sétimo menino, moreno, miúdo.
O oitavo menino louro, branco como a neve,
A nona, muito tempo depois, suave, doce e forte, meiga e geniosa.
Até  a quarta  filha moraram entre dois sítios perdidos no sertão, de propriedade de conhecidos e compadre, e logo após passaram a ser meeiros, prática muito usada no interior,  onde arrenda-se a terra ou a lavoura de algum produto, pagando ou recebendo no final da safra.
Desde modo, foram  criando os filhos com extrema dificuldades, passaram por inúmeras crises financeiras, as vezes faltando até alimentação adequada  para uma família tão grande. As vezes faltava dinheiro para o básico, faltava vestuário, calçados.
Da terra tiravam algum sustento, mas faltava os derivados.
Cansados da árdua luta dos campos, das plantações, resolveram  juntar a prole e morar na cidade, o que trouxe problema duplo, se no sítio podia encontrar com dificuldade algum alimento da terra, na cidade, a coisa era mais escassa, tinha que trabalhar, para ganhar algum dinheiro e poder comprar alguma coisa, e emprego não tinha, senão fazer parte dos que pegavam um caminhão bem cedo, trabalhar na colheita de algum fazendeiro, e retornar a noitinha com uns poucos trocados.
A casa era de tábuas, encapadas com barro, o chão era de terra batida,  as camas eram estrados de madeira onde colocavam os colchões de penas de aves, os cobertores eram confeccionados com retalhos de roupas velhas, o fogão a  lenha, buscada nas redondezas, gravetos caídos de árvores a beira de algum caminho. Televisão, nem pensar, tinha um rádio velho que informava as notícias e o jornal do Brasil,  a rua de terra, onde escorria a enxurrada nas épocas das chuvas, e na época da seca, levantava o pó, que inundava tudo.
Tinha pé de goiaba, mandioca e milho no quintal, tamarindo no vizinho,
Tudo muito rústico,entretanto muito limpo,
Nasceram  outros três filhos, época de escassez ,  dificuldades,  poucas oportunidades, crianças pequenas, sem recursos, sem regalias.
Procurando amenizar um pouco a penúria, foi procurar roupas para serem lavadas em casa, eram lavadas a  mão ( não existia tanques, nem lavadoras automáticas), fazia se uma engenhoca com  uma peça de madeira apoiada em outra madeira, parecia um tobogã, e a roupa era lavada assim, e passadas a   ferro de brasas, fazia pirulitos,(uma calda de caramelo, embrulhadas em papel em forma de cone) para o filho mais velho vender na praça,
Havia um parente que possuía uma revenda de carnes,  o que não vendia, tornava-se na maioria das vezes,  a "mistura", para toda a família.
Os maiores iam a escola, os pequenos ficavam na barra da saia da mãe, a brincar com espigas de milho, como bonecas, os meninos faziam carrinhos de madeira, bolas de meias já furadas, recortavam papéis velhos para fazerem pipas e faziam o enterro de formigas, cobriam as cabeças com  toalhas a fingirem que o cabelo era comprido,
Os maiores ajudavam a cuidar dos menores, ajudavam a mãe na entrega da roupa lavada, brincavam na rua ao entardecer, subiam em árvores, corriam na enxurrada quando chovia.
A vida era dura, uma família numerosa, com recursos escassos.
A filha mais velha, já meio mocinha veio a conhecer um rapaz e logo se encantaram e se casaram, o encantamento foi tão rápido para começar como para terminar. Resultando na geração de uma filha.
O filho mais velho aventurou-se a seguir um tio, para uma  distante cidade mais prospera, e logo a filha mais velha veio a acompanha-lo. Apareceu o desejo na família, induzida a sonhos de uma melhor qualidade de vida a se mudarem para esta outra cidade, distante o bastante para deixar tudo para trás, os parentes,  os amigos, a velha miséria,.
Juntaram os poucos pertences e lá foram eles, entretanto as flores sonhadas, o conforto esperado estava muito distante. Todos foram forçados a se confinar num cubículo  de quatro paredes, os mais velhos encontraram sub empregos, novas necessidades, novas dificuldades.
Entre um ano, mudaram para três bairros , cada um com uma nova dificuldade, com novo desafio, até que o marido procurou emprego em uma cidadezinha próxima, que estava começando a progredir e logo trouxe a família para ali residir.
Mais uma vez a realidade estava fora de ser confortável, longe de ser o ideal, a primeira moradia podia ser chamada de moradia coletiva, sanitário coletivo, casa de madeira, piso de terra batida, quintal dividido para várias famílias, ai se aprende a compartilhar e estabelece-se um acordo mútuo para a sobrevivência geral.
Os filhos maiores começam a trabalhar, ora "catando algodão", "apanhando laranjas", prestando serviços em casas de família, em fábricas de tecelagens, crescendo, começam a estudar.
Mais uma vez a vida rural os chama e iniciam a tentativa, buscar a sorte com uma plantação de tomates, se houvesse safra boa e o preço  bom, talvez desse um pouco de lucro, mais uma casa rústica de ripas de madeira, onde o vento e o frio entravam pelas paredes a dentro,  forçando os moradores a reforçarem os agasalhos.  A chuva entrava fina e escorria pelas paredes, molhando o chão e o que estivesse perto.
Não obtiveram sucesso, solução encontrada, nova moradia, casa de tijolos, um pouco mais confortável, mas no  período de chuvas, alagava tudo. A coisa ficou pior. tiveram que ser retirados  para um abrigo.
Novamente mudanças, desta feita para um quintal coletivo, divididos entre quatro famílias.
Os filhos já haviam quase todos  crescidos, um já estava se casando,  outros começaram a namorar, estudavam e já começando a trabalhar. Juntando todos a vida começava a dar sinais de uma visível melhora, O  marido consegue um trabalho melhor, puderam então adquirir uma casa  própria,  financiada, a  primeira da família., passando para uma fase de prosperidade.
Casou-se mais uma filha, a outra foi morar sozinha, um virou seminarista, outro filósofo, outro empreiteiro, uma jornalista,.
Pode então descansar da labuta, da peleja, podia desfrutar da vida, até então árdua  e sofrida.
Conheceu a fartura, a despensa cheia, a casa bonita, a agua encanada, a luz elétrica devidamente ligada, os eletrodomésticos, os shopping, as grandes magazines, o pagamento a vista das contas, pôde ter várias peças de roupas, alguns pares de calçados.
Perdeu um dos filhos de maneira trágica, que tirou o chão da próspera família, logo após enterrou outro filho nos entreveros da vida.
Casou e recasou os filhos, teve netos, bisnetos. 
Ficou doente, fez tratamento doloroso e prolongado, recuperou-se, fortaleza ambulante.
Frequentou a comunidade, doou-se a serviço da Igreja, dividiu seu tempo entre a família e o serviço pastoral, fez inúmeras amizades, duradouras, viajou o país, visitou o estrangeiro.
Mulher grandiosa, tirou forças de onde não tinha, socorreu a família nas necessidades financeiras, nos relacionamentos difíceis, ligeira vinha em auxílio a quem precisasse, socorria  vizinhos,  amigos,  desconhecidos conheciam seu desprendimento, vinham  achegando, encontravam calor e  conforto.
Foi mãe adotiva de quem quer que passasse  por perto. Adotava a todos.
Tornou-se grandiosa árvore que dá sombra e abrigo a quem precisasse.
Serena, de olhar cativante, ternura nos gestos,
Força nas atitudes, decidida nas decisões
Empreendedora, disposta, incansável.
Disponível, acolhedora.
A doença a acolheu, trazendo um imenso sofrimento a toda família e a todos que a rodeavam.
Foram dias de resignação, entrega, sofreu pacificamente.pacientemente.
Continuou meiga, doce, serena.
No leito do hospital, cativou a todos os que a atendiam,  deixando seu rastro de personalidade, exalando ternura, desprendimento..
Despediu-se da vida, serena, tranquila, ao redor,  lágrimas e manifestações de carinho
Saudades eternas.
Com presença marcante nos corações que ficaram,  deixa a certeza de uma vida dedicada à família, aos outros, agregados, companheiros de jornada.
A marca de sua presença não será apagada, deixou frutos.
Em cada um que compartilhou  sua permanência na terra.
A morte não a venceu, seu exemplo permanece.
Descanse em paz, na certeza de ter feito o melhor,
Foi heroína de sua história, na luta, na garra, na coragem.
Obrigada, Deus por esta Pequena Grande Mulher.






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